A DOR QUE DÓI MAIS (Por Ana Hass)
É muito difícil definir a dor que um paciente com fibromialgia sente. Pode parecer uma frescura, mas não é. A dor é real. Ela está lá, aqui, acolá. Some, como milagre. E reaparece. Com medicamento, a dor física pode até dar uma trégua, mas aquela da alma continua ali, pulsando.
Não sei dizer exatamente quando comecei a sofrer de fibromialgia. Isso porque quando comecei a sentir uma dor absurda nos braços, esta dor foi tratada como tendinite, em princípio.
Mas posso dizer que, muito provavelmente, meu perfil de pessoa extremamente autocrítica e apegada é um prato cheio e vazando nas bordas para a fibromialgia ir entrando, aquela dorzinha nos braços, nas pernas, nos ombros, nos quadris, no maxilar, no peito, nos tornozelos…
Eu poderia perfeitamente me chamar Maria Das Dores! Mas esta dor é diferente daquela derivada de uma pancada. Enquanto a dor de uma pancada é pontual e vem de fora pra dentro, a dor da fibromialgia é imprecisa e vai de dentro pra fora. Uma dor estranha, que queima, que arde.
Dizem que pessoas extremamente autocríticas sofrem de fibromialgia. Mais especificamente aquelas que não perdoam ou perdoaram seus erros do passado.
Os espíritas vão além da explicação psicossomática e defendem que a fibromialgia pode vir de “erros e inconformismos” de outras “encarnações”.
Já a Psicologia diz que pessoas muito rígidas e críticas consigo mesmas e com os outros, além de apegadas ao passado podem vir a sofrer de fibromialgia.
Não sei sobre “outras encarnações”, porém sobre esta posso dizer que perdoar algumas ações ou omissões no decorrer dos anos para mim é muito difícil.
Vez por outra me pego remoendo atitudes de vinte anos atrás no estilo “Se eu tivesse feito isso, tal coisa não teria acontecido…”. O sentimento de culpa também é enorme.
É difícil suavizar ou pensar que as coisas seguiram um rumo porque era assim que tinha de ocorrer, mas o peso que carregamos é grande.
Bem provável que a sensação de peso nos ombros, das pernas irrequietas e a insônia sejam mecanismos do nosso cérebro para ficar remoendo determinada atitude – e não nos deixar dormir.
Por mais que conscientemente a gente pense “nossa, mas faz tanto tempo”, o cérebro parece remoer em slow motion tudo que poderia ter sido diferente: o namoro da adolescência que teve um fim bem infeliz; o concurso público que você não foi aprovado porque não estudou o suficiente; o divórcio; os filhos que não tiveram a sua atenção e agora já estão moços e se debandaram mundo afora.
Queremos ter controle sobre tudo que aconteceu – e que deu errado.
Ouso dizer que os que sofrem de fibromialgia também querem controlar o presente e o futuro para que dê tudo certo desta vez e quando as coisas não acontecem do jeito esperado, a dor vem com tudo.
Vive-se como se não houvesse perdão, como se não fôssemos humanos passíveis de erros, mas robôs programados para dar certo, para ser um sucesso, uma família exemplar, um emprego bem remunerado e incrível, um casamento fantástico, viagens paradisíacas, uma casa cinematográfica…
Acredito que a era das redes sociais, do Instagram e Facebook em que vemos a vida alheia como idílica e a nossa tão “chocha” nos deixa mais críticos e “fibromiálgicos” do que nunca!
Quando eu começo com esta ladainha cerebral do apego, para driblar as dores que latejam, além de muita terapia eu procuro desviar o foco, praticando os meus hobbies sempre que posso.
No momento não estou tomando remédios, embora os médicos insistam em receitá-los.
Uma das práticas que venho adotando, para me sentir melhor é aceitar que a dor existe e não ignorá-la.
Aceitar que não sou e nunca serei perfeita, assim como ninguém é.
Que minha vida está longe de ser dos sonhos, mas é a que tenho e preciso tomar as rédeas dela.
Notei que venho sentindo dores, sim, mas não deixo isso me derrubar, simplesmente mudo o foco e… voilá! Descobri que sou mais forte do que ela: a dor que dói mais.
Celi Helena
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